segunda-feira, novembro 28, 2005

Respostas sem qualquer sentido (Escrito a partir do B.I)

Eu, o retrato desactualizado do que sou, tão estranho como íntimo, sorridente... como era suposto que fosse quanto tentam eternizar a memória do que sou.
Nós, os humanos, gostamos de poder dizer que um dia fomos felizes, e esta ridícula forma de forçar um sorriso é apenas um tentativa de realização pessoal, seja como for... continuarei a sorrir para as fotos.
Noto que me acho chocante, um ser não-humano ou desconhecido, realmente, conheço pouco da minha geografia superficial.
Sou uma criança. Feliz, mas infantil, daquelas crianças que gostam de voar com os sonhos e as utopias, e chateiam as pessoas crescidas querendo partilhar tudo isso com elas.
Sou uma figurinha deplorável, e o melhor é que digo isto com um sorriso na cara, não me importo muito com as coisas inevitáveis.
Há coisas que nunca mudam, outras, porém, que mudam, e a utopia é feita disso, do limiar entre o evitável e o inevitável, do exigir com firmeza e seriedade o impossível, como se fosse um direito adquirido.
Naquele meu quadradinho pequenino, tão estranho como íntimo, feito de carne e pouco mais, a vida parece simples, parece fácil amar o sol quando ele brilha, parece fácil amar a chuva quando o céu chora, parece fácil amar a palidez quando o outono cai e as folhas começam a dançar com o vento, parece fácil amar um amigo que nos sorri nos tempos difíceis e que sabe dizer "coragem" quando ela é mais precisa, parece fácil amar... e na verdade, é, tal como tudo o que acabei de dizer, voltarei a dizê-lo, se me perguntarem quem sou, e eu responder com a ignorância estas mesmas palavras.

sábado, novembro 26, 2005

Encostar na tua

O que fazemos no meio deste nada, neste deserto de ausências e chegadas sem sentido?... O sol entrou nas frinchas do meu quarto e eu só penso que deverias ser tu a entrar aqui, a entrar aqui sempre para me assaltar, chamando o meu nome nessa voz em que desde cedo me perdi...
Não podia imaginar que um dia a minha vida fosse mesmo "encostar na tua"... E agora?...

Pablo Neruda (O Vento na Ilha)

«O vento é um cavalo:
ouve como ele corre
pelo mar, pelo céu.

Quer levar-me: escuta
como percorre o mundo
para levar-me para longe.

Esconde-me em teus braços

por esta noite apenas,
enquanto a chuva abre
contra o mar e contra a terra
a sua boca inumerável.

Escuta como o vento

me chama galopando
para levar-me para longe.

Com tua fronte na minha

e na minha a tua boca,
atados os nossos corpos
ao amor que nos abrasa,
deixa que o vento passe
sem que possa levar-me.

Deixa que o vento corra

coroado de espuma,
que me chame e procure
galopando na sombra,
enquanto eu, submerso
sob os teus grandes olhos,
por esta noite apenas
descansarei, meu amor.»

in Os Versos do Capitão

sábado, novembro 19, 2005

Diário de um "Antropólogo em Marte" (II)

Do meu discurso, da minha vida ninguém entende nada... Apenas o que construo com o disfarce deste invólucro comum que sempre fiz questão de ostentar como a minha única pele... Aterroriza-me a diferença, não me atreveria a divulgar mais do que a mediocridade do dia a dia onde actuo na discrição absoluta de uma vida demasiado comum...
Ninguém entende nada... Ninguém vê nada... As minhas lágrimas são infinitas, porém inócuas e invisíveis...
Eu amo... Amo ou amei demais... Amei pelas palavras e pelos gestos e mais tarde amei pelo corpo...
Será possível percebê-lo? Haveria alguma forma de contá-lo???
«Quem amo não existe» (Fernando Pessoa)
Privaram-me do homem que eu amava... Nunca (mais) o vi... Mataram-no e nem dei por isso, pois às vezes descobrimos em nós segredos que embatem com tal violência que nos deixam em pleno embotamento afectivo que nos limita as acções e o pensamento... Amei a mesma pessoa que o matou, porque eram ambos o mesmo ser, o assassino e a vítima, The Beauty and the Beast... Mas houve um luto que não fiz... Houve uma dor que não tive, porque tinha pressa em substituir o meu amor, porque não podia chorar por quem não existia... Por quem nunca tinha existido...
Mas, para mim, foi como se o tivessem matado, o homem que eu amava e por quem sempre tinha esperado... Foi como se o matasses... E eu amei-te tanto, ainda que ferida por tanto engano... A dor ainda é muita... E eu amei-te tanto... E ainda amo... Porém, «Minha vida fecha-se como um leque» (Fernando Pessoa)

sábado, novembro 12, 2005

Prelúdio... (Foi assim que aconteceu)

«Como é que começou este amor? Por palavras. Começou pelas palavras. Palavras escritas num espaço distante e invisível. Um espaço contemporâneo da comunicação das emoções. A ligação deu-se aí, e foi precisamente nesse momento que a carência de ambos colidiu com a necessidade de se amarem. As palavras substituíram o corpo, a presença que domina. Se eu comparasse a distância com o silêncio, diria que a distância perturba menos as palavras que se escrevem. Diria que o silêncio exerce o seu domínio sobre as palavras que se dizem. O amor é um espaço obsessivo. Chamo espaço a um sentimento que foi formado entre a distância e o silêncio. Poderá o amor sobreviver sem a sua própria imagem amorosa? Onde existe o lugar dessa imagem que armazena todos os sinais do prazer e da paixão? Quero ver se compreendo: será a imagem uma depressão deste amor? Eu sou o domínio da minha imagem sobre as palavras que revelo nessa união. Construí uma ligação feita de sentimentos transgressivos. A transgressão é um defeito de imagem que não personaliza o amor que se sente numa distância física. Mas nada é mentira numa relação distanciada; tudo é ainda mais verdadeiro e fértil, ainda mais protegido pela ausência. O sexo também entra neste processo. Chegar a ti por uma necessidade de prazer. Sentir os corpos serem possuídos e acariciados por recordações emocionais. Aperfeiçoar a relação sexual através da distância. Viver no absoluto de amar no silêncio.»
(Fernando Esteves Pinto- Sexo Entre Mentiras.)

Retrato

«Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
Em que espelho ficou perdida a minha face?»

(Cecília Meireles)

A dor vivida em silêncio

O meu rosto parece que foi de novo esculpido...
As feições estão mais cerradas, os olhos enegrecidos...
Será que ainda se vê em mim a imagem daquela menina que transportava o mundo todo no seu sorriso?
Felizmente que o nosso coração não sangra... Felizmente que a dor e o segredo que transporto se incendeia apenas no silêncio da minha mente, obscurecendo-me o olhar e cerrando-me o semblante sem que mais ninguém o note...

terça-feira, novembro 08, 2005

Um lago de chamas

Por vezes sinto que circulo num lago de chamas sem ninguém que me estenda as mãos para uma margem... E depois páro um pouco e percebo que sou eu que insisto em querer viajar em terrenos movediços... E pago um preço demasiado alto por isso...

Amor (XX... já perdi a conta...)

Ele disse-lhe: "Entrar dentro do teu coração é amar-te instantantaneamente..."