sábado, outubro 29, 2005

Diário de um "antropólogo em marte" (I)

A solidão é já um espaço conquistado... Encerro em mim tantos segredos... Ninguém repara que morri...
Todos tão atentos, insuportavelmente próximos e no entanto, estou morta e nem o cheiro pestilento os alerta para a morte...
Pergunto-me se poderei contagiar quem me rodeia, se atrairei a tristeza àqueles que amo...
Não o suporto...
Se fosse possível aniquilar esta existência, aniquilar o meu passado, a gravidez da minha mãe, o meu nascimento, a minha concepção, se tudo pudesse voltar atrás e se reiniciasse um novo mundo sem a minha presença, sem que os meus olhos presenciassem tudo que viveram... Poderia nascer outra criatura no meu lugar?
Uma que ocupasse um lugar mais concreto e encaixasse melhor nos esquemas montados... Uma que não tivesse nascido com uma ferida no lugar do coração e que amasse menos e suportasse mais a sua dor e a dos outros...
Precisava que tivesse nascido um ser assim em meu lugar, alguém com mais defesas, com mais coragem para enfrentar o mundo, alguém que não perdoasse sempre tudo, alguém que não escutasse atentamente todos os corações e parecesse carregar em si a capacidade de ler dentro dos outros, os seus medos, os seus sonhos, as suas mágoas e os tormentos...
Alguém a quem o amor não faltasse... Alguém com um lugar comum entre os demais...

Para quando regressasses...

À noite, queria estar nesse quarto, para te abraçar, quando regressasses...
Mas tu não me deixaste...
Há momentos em que não sou capaz de suportar mais esta saudade, sinto que morro e projecto-me nos teus lábios e quase te sinto comigo...
Preciso tanto de ti... E no entanto, não posso...

quarta-feira, outubro 26, 2005

Deixar-te ir...

Deixar-te ir, sabendo-te frágil, oscultando-te os passos e percebendo-te no limite, quase leva de mim todas as forças...
Deixas-me o peito submerso num manto de inquietação que me turva os sentidos, servindo-se do amor que te dedico para me atormentar como um espinho...
Quem me dera guardar-te numa redoma e proteger-te de tudo que te rodeia...
Quem me dera congelar o teu sorriso e manter-te sempre dentro do meu íntimo...

segunda-feira, outubro 24, 2005

Viver dentro de mim

Onde andas?
A tua ausência mata-me de saudade... Quem dera que entendesses... Povoas-me a memória e os sentidos... Se soubesses dos meus desejos, se soubesses da vontade que me assalta a cada instante... Se estivesses dentro de mim... Se pudesses viver o que vivo... Se pudesses sentir e amar e viver e desejar e entender e perdoar dentro do meu corpo... Se pudesses saber como dói amar-te desta forma doentia, como dói sentir-me diferente e errada... Como me dói saber que te magoo, saber que desconheces que tento o impossível precisamente porque te amo e porque amar-te é mais forte que a minha vontade e mais forte do que este desejo visceral que me domina e entontece... Se tento amar-te fraternalmente é porque te amo e porque desejo o teu bem acima de todas as coisas... E se te amo, não posso querer a nossa perdição... Não vês que te amo???... Diz-me que o vês... Diz-me...

Noites Brancas

As saudades podem matar...
A mágoa também...
E o amor mais que tudo...
Sobretudo em Noites Brancas...

Amor (XXVIII)

O amor é capaz de nos matar, embora o nosso corpo permaneça vivo e se assemelhe aos demais...

sábado, outubro 22, 2005

Da Paixão e do Amor

Hoje apetece-me falar da paixão. Tantas vezes, e erradamente, confundida com o amor. Erradamente porque o amor e a paixão nada têm em comum. São matérias diferentes. Universos diferentes. É possível amarmos alguém e apaixonarmo-nos por outrem. O amor não pressupõe paixão, nem pela pessoa que amamos, e permite a paixão por outra pessoa que não a que amamos. Nem a paixão pressupõe o amor. Eu já me apaixonei por alguém que não era a pessoa que eu amava. Muita gente não acredita, ou que eu continuasse a amar uma, ou estivesse apaixonado por outra. O que era mentira. Eu amava uma e estava apaixonado por outra.
A paixão é em tudo diferente do amor. O amor é algo de inexplicável, enquanto a paixão é explicável até ao mais infimo pormenor. A paixão acontece por afinidades físicas, intelectuais, psicológicas, o que for. O amor não. O amor acontece porque tem de acontecer. Um literato ama um ignorante. Um comunista ama um nazi. Ama-se os feios. Ama-se as más pessoas. Ama-se toda a gente, porque o amor não tem que ver com tipos, géneros, sexos, preferências de qualquer tipo. O amor não tem qualquer explicação lógica.
O amor é uma construcção, mas já existe antes de ser construído. Ou melhor, é uma descoberta dessa construcção, como quem aos poucos, e conjuntamente, seguindo na mesma direcção e ao mesmo ritmo, vai rumando por um caminho desconhecido. A paixão não tem nada que descobrir. É entertenimento puro, e não há mal nenhum nisso. Mal há na confusão entre amor e paixão.
Diz-se que a paixão é mais excitante e mais leviana (por vezes criando-se uma absurda conexão entre a leviandade e a excitação, como se uma das coisas levasse à outra, sendo a ordem qual for, é bizarro pensar-se assim). Mas vejamos: a paixão é explicável em todos os pontos, apaixonamo-nos por uma mulher bonita, por uma mulher interessante, e isso pode ou não ser leviano. Mas haverá algo mais leviano do que um sentimento tão profundo e forte como o amor que não podemos explicar porque existe? E quanto a ser menos excitante: não será a paixão mais aborrecida do que o amor, sendo que não tem mistério, sendo que é explicável, sendo que é humana até à última instância? E o amor: haverá algo mais excitante do que um sentimento completamente inexplicável, de que nada sabemos, que temos de descobrir aos poucos, devagar, com calma, com tempo, onde nada é certo, um sentimento tão perfeito que não é humano, é divino?
A paixão pode proporcionar muito prazer, é evidente. Mas o amor proporciona um prazer maior porque mais do que nos fazer felizes momentânemente, faz com que esse momento, mesmo que seja fugidiu e único, dê para toda a vida.

sábado, outubro 15, 2005

Amor (XXVII)

- Existe alguma forma de eu ficar sempre contigo?...
- Mergulha comigo no sonho, existe um lugar para nós desde que o mundo nos fechou as portas... Mergulha nas memórias...
- E isso terá de ser tudo?...
- É tudo que temos...
- «Um minuto inteiro de felicidade! Será pouco, mesmo que tenha de dar para toda a vida de um homem?...»

Amor (XXVI)

Um dia eles seriam livres. Mas temiam-no. Era forçoso, a liberdade apenas surgiria se o amor os conduzisse à separação absoluta dos corpos aprisionados.

Amor (XXV)

Estar preso a quem se ama é melhor do que ser livre.

Amor (XXIV)

O amor era um desafio que eles queriam travar constantemente. Faltavam-lhes, porém, as forças...

quinta-feira, outubro 06, 2005

Amor (XXIII)

Na distância ela ouvia sempre a sua voz, como se estivesse dentro dela a ressoar eternamente:
- Queria-te aqui... Sem medos... Sem mundos...

Amor (XXII)

- O amor aprisiona-nos!- Disse ela. Ele segurou-lhe nas pequenas mãos acorrentadas e segredou-lhe:
- Mas nós nunca fomos livres!...