« Home | Eu vou partir, sabias?... » | Reflexões Sobre O Dia Da Independência » | Que fazer com o ódio? » | Estória possível sobre a criação da canção Lover, ... » | O Culminar Do Mal » | O Paciente » | Para dentro do teu mundo... » | "Frequentas minhas mais estranhas fantasias" » | Encontrar o meu Compasso » | Cúmplices »

Tarde das facas longas

Estava ali. Á tua porta.
Tudo temia mas ao mesmo tempo tudo me fazia ter mais força, por ti.
sentia-me destemido, único e honroso.
toquei duas vezes.
A tua voz ácida rompeu o silencio que me encorajava para o transformar em receio, apenas disseste “entra” mas a mim pareceu-me “morre”.
entrei, e subi pelo elevador que já me esperava cá em baixo. Ao sair do elevador respirei fundo e tentei libertar-me da culpa que me sufocava. Eu sei, sou culpado por tudo ter acabado. Mas sentia-me com força para te ter de volta. Então aproximei a mão da porta e por instantes hesitei...mas bati.
Abriste a porta e a tua presença asfixio-me, queria puder fugir e correr para os braços da minha mãe, dizer-lhe “mãe, tenho vergonha de mim”.
A verdade é que não consegui dizer nada, apenas consegui esboçar um sorriso que a ti deve ter suado a cinismo, então retribuíste-me com um olhar baço e cansado:
- olá, entra- mas na tua face não havia nada além de traição, rancor e ódio.
Passaste para trás da porta e eu entrei. Nem olhaste para mim mas não levei a mal, apenas sussurrei de mim para mim mesmo “cada um tem aquilo que merece!”.então segui-te até ao quarto e ao passar por um corpo qualquer disse:
- boa tarde- com uma voz viva.
Mas não obtive resposta o que me vez estremecer,sentia-me uma criança com o destino nas suas próprias mãos, só depois me lembrei que era mesmo isso que eu era, então prossegui a trilha que me levou ao teu quarto onde já tinha sido feliz e que agora era repleto de silencio e cinzento.
Sentei-me na cama e para me sentir seguro e disse:
- Posso? – mas não consegui evitar que a minha voz saísse trémula.
Senti-me tão mal quando ouvi um “não” irónico que não queria dizer que não me podia sentar mas que não podia estar seguro.
Limpei a testa do suor e tu continuavas sem olhar para mim mas prossegui:
- Olá – e senti-me estranho por ser a primeira vez que lhe dizia algo nessa tarde.
estava em coma. Parecia que nunca soubera o significado de ser feliz. Tudo era vazio, então perguntei-me “sara, tu vives aqui? Dentro deste covil de dor?”.
Não me lembro muito bem do que falamos nessa tarde pois não estava nem vivo nem morto, estava num limiar de sofrimento a que chamam “coma”.
lembro-me que me lamentava, dizia qualquer coisa como “será que o nosso amor acabou? Eu não tive a noção do seu final”, “ não percebes que te adoro?”, “ eu errei, mas será que o nosso amor não merece mais oportunidades?”. Como resposta tinhas sempre uma voz rancorosa e ácida “o nosso amor nunca existiu para ti”, “ tu não precisas de mim para nada”, “não vale a pena dizeres que erraste, se ao menos mudares em alguma coisa... mas não mudas”.
Será que não percebeste que estava ali a tentar mudar?
Lembro-me que não te disse aquilo que fui lá para te dizer, por incapacidade. E lembro-me também e disso nunca me esquecerei, da tua voz irónica e amarga.
Não me recordo de um segundo de felicidade nas horas em que estive contigo nesse dia, apenas me recordo de um “adeus” frio e ter saido pela tua porta ás chicotadas a mim mesmo.
O ódio crescia em mim. Mas era o pior de todos os ódios, é aquele que sentimos por nós próprios.
Fui sozinho para casa, passava pelos estranhos na rua, mas agora pareciam ainda mais estranhos. As ruas estavam vazias. O teu nome estava escrito por toda a parte, e ecoava em mim como se me quisesse martirizar para sempre.
Continuava a pensar de mim para mim “cada um tem aquilo que merece” e esta frase só a conferia a mim.
Sentia-me cada vez mais longe de mim, nesse momento, era mais uma vez apenas uma criança com o destino nas mãos, mas agora esse mesmo destino sussurrava-me “será que tudo acabou?”.

Miguel!!! Que boa surpresa!!! :o)
Fiquei mesmo satisfeita ao ver-te aqui! Não pensei que gostasses de prosa também...
O teu texto está muito bonito, comove... Boa estreia!!!
Um beijinho e bem-vindo!!!!!!!

Enviar um comentário